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De volta às batalhas...

De: Murilo Saraiva de Queiroz <murilo_at_v...>
Data: Mon, 28 Oct 2002 23:46:16 +0100

"A astronauta contempla a faixa negra de espaço à sua frente e pisca
levemente. Seus olhos definitivamente não são mais os mesmos e ela tem
alguma dificuldade em fixar a visão no campo de batalha que assoma logo ali.
Suspira e sorri, pensando na sua volta à ativa depois de tanto tempo... .
Testa de novo os controles. A nave, quase tão velha quanto ela, resfolega e
treme, fazendo a astronauta prender a respiração por um segundo. Mas a velha
senhora é de confiança, das melhores já feitas e, apesar de enferrujada,
parece não sofrer de maiores problemas. Talvez um pouco de ação faça bem às
duas e, de novo, a astronauta sorri.
Tenta não pensar em sua vida atual, em suas responsabilidades... tudo mudou
tanto desde a última vez! Uma vida tão diferente do que ela imaginava quando
era só uma menina. Não que seja pior, apenas... diferente. Um emprego
difícil, mal pago, contas, responsabilidades, gente que depende dela. É, a
meninice está longe e cheira a Coca-Cola e Natal. Já não há um sorriso no
rosto da astronauta, mas um ar que alguns poderiam ler como dureza, talvez
solidão, mas é só nostalgia, afinal. Ela ainda é uma das melhores - ela no
fundo sabe - e foi por isto que a chamaram. Por um momento, ela pensa na
enormidade de sua missão e lembra do inimigo, que ela imaginava há muito
vencido e banido. Ela supõe que os anos a fizeram mais esperta, talvez mais
lenta e não tão intrépida, mas esperta e paciente, muito paciente. Teme, no
entanto, que o inimigo também tenha se tornado mais malicioso, mais
refinado, com o passar do tempo. Agora, porém, já não há mais volta. Ela
testa de novo os controles e respira fundo. De repente, a astronauta é
tirada de suas reflexões por um grande solavanco! Com agilidade, ela dá uma
guinada na nave que a salva de uma saraivada de bombas. Dispara e desvia,
dispara e desvia. Ela estava errada, a idade não faz diferença! Ela continua
ágil, e os controles da nave parecem tão unidos a suas mãos como se dali
nunca tivessem saído. A astronauta gargalha: que venham todos! Derruba sem
errar um tiro toda uma bateria de inimigos. Devem ser cadetes, a bucha de
canhão do Império. O maldito Império! Nós nos encontramos novamente! Nossas
infinitas batalhas, travadas há tanto, serão agora rememoradas e a
astronauta sabe que a glória pode estar ao seu alcance novamente. De novo,
ela será uma heroína! Um tiro de raspão, a nave sacoleja e seu casco queima.
A astronauta se irrita e atira furiosamente. Mata outros tantos. Outro
esbarrão. A nave falha e a astronauta tem que usar de toda sua perícia pra
escapar de outras bombas, que caem ininterruptamente. Ela sente então o
cansaço, o corpo já não é mesmo, apesar de sua coragem continuar a mesma.
Mais um esbarrão! A nave não vai aguentar! A astronauta se desespera, mas
logo tenta retomar a frieza. Se ao menos ela pegasse aquele último ali do
esquadrão! Espera cautelosa e, quando a nave inimiga abaixa o suficiente,
ela ataca... e é frita!!! Tudo queima dentro da velha nave! A astronauta
abandona os controles e se entrega ao fim, como uma boa guerreira. Desliga o
Atari e vai à geladeira. Pega uma Coca-Cola (light é claro) e reinicia o
jogo."

Cyntia Beltrão

A doce-e-sempre-bela Cyntia é psicóloga e quando criança alcançou o número
máximo de pontos no clássico Megamania. Ela acabou de ganhar de um Atari
2600 "heavy sixer", presente do maridão, Muriloq, e desde então está
incomunicável na frente da TV. Além de gostar de vídeo-games (ela joga Soul
Calibur como ninguém, com o Lizardman), a Cyntia também adora anime,
quadrinhos, vinhos italianos e charutos (como dizia o Freud, "às vezes um
charuto é apenas um charuto").
Recebida em Sat 28 Sep 2002 - 14:46:31 BRT

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